domingo, outubro 29, 2006

Que mito isto daria !


Alceste e Admeto

Ultimamente tenho comparando os mitos com fatos cotidianos que vejo impressos nas paginas de jornais diários achei e já publiquei por aqui Antígona, Medeia e comparei a situação política que vivemos com um período da Roma antiga e o discurso de Cícero contra Catilina. Esse exercício me faz acreditar cada vez mais que os antigos deuses ainda vivem e nós nos negamos a perceber isto, pois por nossa mente foi condicionada para não ver, nem ouvir nada além da racionalidade imposta pela filosofia e a religião.

Lemos mitos e contos, como uma forma de nos dar um consolo, pois vemos histórias de amores impossíveis, heróis invencíveis e de ideais que revolucionaram o mundo, não para seguir seus exemplos, mas sim para dar ao nosso cérebro a porção de fantasia que ele precisa para encarar a realidade de nosso dia a dia. Não ousamos viver os nossos ideais, não vivemos a eternidade do amor nem acreditamos nos deuses que falam diretamente nas nossas conciencias. Sonhamos e ao acordar as imagens dos sonhos se esvanescem, nos apaixonamos, mas temos tanto medo do amor que logo acorrentamos a paixão e a sufocamos com racionalidades.

Poderia falar horas sobre isto, porém, quero falar de mais uma noticia no jornal, no estadão de ontem vi esta foto aí em cima com um artigo de Jose Sousa Martins – Professor Titular de Sociologia da Faculdade de Filosofia da USP. Neste artigo ele falava de um Tumulo esculpido por Alfredo Oliane que está localizado no Cemitério São Paulo onde descansa o casal Antônio e Maria Cantanella. Encomendada por Maria esta estatua ao contrario do que parece a primeira vista, não representa Antonio atormentado pela morte de sua esposa. Alfredo Oliane, o escultor fez uma das mais belas e comoventes representações do amor carnal e da dor separação. Nela se vê um homem atlético reclinado apaixonadamente beijando uma mulher morta.

Mas como ocorre muitas vezes a realidade é diferente da representação, quando foi concluída a estatua representava algo semelhante à lenda de Alceste e Admeto, onde a esposa Alceste entrega sua vida para que o seu marido Admeto, o Rei das Feras e amante de Apolo, viva o tempo que ela ainda teria de vida.

Maria pediu ao escultor que representasse o seu marido vivo e no vigor de suas forças e plenitude física e ela morta, pois é assim que ela se sentia. Para ela o falecimento de Antonio foi sua própria morte e o restante dos quarenta anos (ela era mais nova que ele) que ela ainda viveria seriam para manter viva a imagem e a lembrança do seu amado esposo, mantendo ele vivo, ela morria para o mundo.

A força desta escultura e das palavras que podem ser lidas, nos epitáfios de ambos, celebra um amor que nem mesmo a morte conseguiu destruir, Ele vivo e sexualmente potente dentro dela da sua alma ainda que morto e ela desejada ainda que morta, mas viva. Um amor que vai alem das fronteiras da vida e da morte, um amor que continua vivo mesmo depois da morte de ambos pois todos que se lembram da história sentem inveja de não ter um amor assim, ou se envergonham de não terem coragem de amar desta maneira.

Como disse antes, nos encantamos com mitos e histórias de grandes amores, mas fugimos aterrorizados diante das paixões impossíveis, com medo da dor da perda, muito antes da perda realmente acontecer.

Maria gravou na pedra sua declaração de amor a Antonio, para que suas palavras pendurassem no tempo e não fossem esquecidas pelos que ali passassem:

“Ó Nino, meu eterno esposo, meu guia e motivo eterno da minha saudade e de meu pranto.Tributo de Maria”

Quando do falecimento de Maria os familiares gravaram o seu testemunho:

“Aqui repousa Maria Cantarella ao lado de seu inseparável e amado esposo”

Tantos buscam lendas, falam dos túmulos míticos de Tristão e Isolda, fazem juras de amor como Romeu e Julieta, mas não sabem que se entrarem pelo portão lateral do Cemitério São Paulo na Rua Cardeal Arcoverde poderão por rosas vermelhas num tumulo real de pessoas reais que viveram nesta cidade e nos deixaram um legado de amor e de eternidade.


Não se afobe, não
Que nada é pra já
O amor não tem pressa
Ele pode esperar em silêncio
Num fundo de armário
Na posta-restante
Milênios, milênios
No ar
E quem sabe, então
O Rio será
Alguma cidade submersa
Os escafandristas virão
Explorar sua casa
Seu quarto, suas coisas
Sua alma, desvãos
Sábios em vão
Tentarão decifrar
O eco de antigas palavras
Fragmentos de cartas, poemas
Mentiras, retratos
Vestígios de estranha civilização
Não se afobe, não
Que nada é pra já
Amores serão sempre amáveis
Futuros amantes, quiçá
Se amarão sem saber
Com o amor que eu um dia
Deixei pra você

Futuros amantes Chico Buarque/1993


Bem... se preferirem temas mais mitológicos, no Cemitério da Consolação existe uma escultura de Nicolau Rollo representando Orfeu e Eurídice.

Noite dos mascarados




Quem é você, adivinha se gosta de mim
Hoje os dois mascarados procuram os seus namorados perguntando assim
Quem é você, diga logo que eu quero saber o seu jogo
Que eu quero morrer no seu bloco, que eu quero me arder no seu fogo
Eu sou seresteiro, poeta e cantor
O meu tempo inteiro só zombo do amor
Eu tenho um pandeiro, só quero um violão
Eu nado em dinheiro, não tenho um tostão
Fui porta-estandarte, não sei mais dançar
Eu, modéstia à parte, nasci prá sambar
Eu sou tão menina, meu tempo passou
Eu sou colombina, eu sou pierrô

Chico - Noite dos mascarados

quarta-feira, outubro 18, 2006

Desabafo Dionisíaco



Poucos sabem ou compreendem o porque das palavras, que muitas vezes perdem os seus sentidos originais e viajam pela egolatria dos humanos e se transformam em algo que nunca foram.
Palavras são signos, sinais que desesperadamente precisamos compreender, para que possamos realmente conhecer a nós mesmos.
Gênio tem a mesma raiz de Genitalis (o que gera, fecunda) no sentido de Lectus genialis, o leito onde seriam gerados os filhos. Depois, Genialis passou a ser aquele que sacrifica ao seu Gênio, sendo então aquele que se diverte, o alegre, o festivo.Portanto Genial não é aquele “nerd” enfiado em elucubrações e experimentos em busca de um prêmio Nobel. Genial é aquele que vive e deixa sua mente livre para ter novas idéias, o que gera as novidades espontaneamente e que se diverte com isto, com ter idéias únicas, genuínas.
Porém quando influenciados pelos gregos que filosofavam e que faziam questão de afirmar que pensar dava trabalho, que era um ato de poucos e que o genial só poderia vir da lógica, não apenas mataram o gênio, como também acabaram com a poesia e o impulso da arte, pois tanto o poema quanto a obra de arte necessitaram então da métrica e da lógica. Mataram o sonho, a criatividade e todas as coisas que eram geradas em momentos oníricos.
O mundo perdeu a graça e a fantasia, os Deuses que habitavam a Terra se entediaram com a chatice humana, e nem entravam mais no sono dos humanos, pois este sonho iria ser analisado e interpretado por sacerdotes cheios de regras e normas que inseriam lógica no que nascia livremente e com isto amordaçaram aos deuses que não mais falavam com seus filhos.
Tão distantes estavam os deuses que agora precisavam de intermediários e mandamentos escritos e se tornava tão complicado falar aos homens, que não existia mais nenhuma graça em ser deus, pois aguardar os augúrios e os decifradores de sonhos era tão cansativo que dava sono aos deuses. Muitos deles adormeceram e outros foram para lugares distantes e longínquos, onde a racionalidade e a lógica não impedissem o contato com os humanos.
Apenas um, o mais humano dos deuses, não abandonou os homens. Dionisio, através do teatro e da irracionalidade desta arte, não foi submetido às normas apolíneas das artes. Anárquico, ele desafiou desde os reis e imperadores até o período negro da inquisição, levando aos homens a possibilidade de honrar seu gênio e, a partir disso, novas correntes artísticas buscavam a genialidade e a originalidade.
Porém hoje até mesmo ele se esgota em vista da mediocridade reinante, que repete formas e formas pós-modernizando tudo. O último deus também agoniza. E a criatividade e genialidade humana agonizam com ele.
Quando uns poucos como nós se voltam ao paganismo em busca da nossa liberdade de pensar e viver, sempre aparece um moralismo retrógrado que impõe regras e grita do alto da sua boçalidade e ignorância as palavras do velho bordão Cristão e dominador, “LIBERDADE NÃO É LIBERTINAGEM” se esquecendo totalmente do antigo sentido da palavra.
Libertino para os romanos era o escravo liberto, aquele que ganhou a liberdade como um favor, e não por sua luta. Portanto devemos todos inverter esta frase e buscar a verdadeira Liberdade, que é a liberdade obtida não por regras no nosso pensamento. Busquemos a nossa criatividade, a nossa Genialis Genitalis, a Genialidade que nos foi dada desde o Berço, a liberdade de Pensar e Sonhar sem seguir as velhas regras impostas pelas sociedades dominadoras e retrógradas. Vamos despertar os deuses adormecidos e buscar nas matas, montanhas e desertos os antigos deuses que nos abandonaram, pedindo que eles novamente falem conosco, nos inspirem para que recriemos o novo. Então, ao lado de Dionisio, o Pater Líber, finalmente gritemos aos opressores, que sabemos o que é liberdade e que nossa palavra de ordem, daqui por diante, será:
“LIBERTINAGEM NÃO É LIBERDADE”

domingo, outubro 01, 2006

Como foi votar com nariz de Palhaço





Na verdade não senti diferença nenhuma, caminhei uns 200 metros antes de entrar na Seção Eleitoral, passei por policiais militares e entre pessoas que saiam da eleição, não percebi nenhuma reação destas pessoas, todos praticamente fingiam não me ver, nem sorrisos e tampouco recriminação, era como não estivesse com o nariz pintado de vermelho.
Andei por dentro da seção, fiquei na fila, falei com a mesária que estava na porta e nenhuma reação, assim como os outros mesários. Sai da seção e retornei para minha casa onde limpei a pintura.
Ou seja, a impassividade das pessoas foi o que me assustou, afinal alguém com o nariz pintado, deveria no mínimo causar sorrisos.Apenas uma criança comentou com o pai, foi a única reação que percebi.
Creio que me vendo andar tanto a caminho da seção eleitoral, as pessoas se viam num espelho, ou seja, éramos todos palhaços votando em candidatos que não respeitam a nossa vontade.
Acredito no nosso país, tenho fé no Brasil. Mas para mudar o país deve haver a participação da sociedade, atos como este do nariz de palhaço, boicotes e protestos da população, pois enquanto nos quedarmos impassíveis continuaremos a usar invisíveis narizes de palhaços, somente a participação de toda a população, poderemos tirar da política estes que com suas safadezas nos levam a fazer este papel na democracia brasileira.
Somente unidos e participando poderemos colocar estes políticos que hoje riem de nós para o lugar onde deveriam estar: no circo, ou na cadeia.