segunda-feira, dezembro 31, 2007

It's Too Late Baby


Algumas coisas acontecem quando acertamos um novo rumo para nossas vidas, este ano que se passou, foi um ano de sofrimentos e de acertos, muita coisa boa aconteceu apesar das muitas coisas ruins que passaram pela nossa vida este ano. Mas quem sou eu para reclamar ?
Falar das coisas ruins para justificar algo é perda de tempo, ainda que de muitas preocupações e transtornos, acho que fecho o ano com saldo positivo, afinal o que não nos mata, nos faz mais fortes e crescer dói muito.
Este ano de Zeus que ainda não acabou sem duvida foi um ano de crescimento espiritual e aprendizado. E como aprendi... algumas vezes açoitado pelas Erínias, outras puxado por Afrodite ou até mesmo carregado por Dionisio. Os deuses viveram comigo este ano, estiveram presentes o tempo inteiro, me mostrando erros, me ensinando caminhos e mostrando que muitas das minhas escolhas estavam corretas e muitas foram desastrosas no passado.
Este ano, a partir de março, com o inicio do ano de Pater Júpiter, reformatei meu hard disk, e criei espaço para coisas novas e deixando nos velhos CDs de backup, e não instalando muitos programas viciados que geralmente usava nas horas do aperto. Zerei, comecei de novo...
É complicado, afinal tudo funcionava, tá certo que não era da forma que eu queria, mas funcionava... Apreender o novo, que nunca eu havia visto funcionar era arriscado, mas Júpiter me deu forças para isto, e eu botei fé e arrisquei tudo.
Não posso dizer que já deu certo, mas pelo menos algumas das coisas que mais me faziam falta voltaram a aparecer, antes do natal resolvi pintar novamente, nada muito técnico mas sim algumas aquarelas para agradecer o povo que me acolheu, fazia uns 7 anos que não pegava num pincel, e uns 15 que não lidava com aquarela. Esta semana botei a mão na massa e fizemos artesanato com massa de biscuit.
E teve muitas outras coisas boas este ano firmei um estilo de escrever mitologia, e creio que 2008 saia pelo menos um livro meu.
Mudanças, mudanças e mais mudanças... depois de 30 anos de praticas solitárias, me juntei a um grupo, uma nova familia, gens, clã ou tribo, e com eles aprendi que estava na hora de percorrer um caminho e seguir uma disciplina e jogar fora tudo que eu fazia de indisciplinado ou na louca, muito do que eu ainda fazia, atrapalhava, muito mais que ajudava. Portanto entre o natal e ano novo foi tempo de faxina, limpeza, purificação e uma fogueira com mais de 200 litros de papéis e macumbarias que fui recolhendo por todos cantos da casa. Esta demorou 18 horas pra consumir tudo. Outro tanto foi colocado na porta para que levassem e fizessem uma energia que estava estagnada circular.
Sei que ainda tenho uns meses até o próximo ano, e sei que ainda vai ser difícil passar por eles, mas Zeus é Pai e sei que tudo que aconteceu no ano dele foi ensinamento da melhor qualidade e que a partir de março começo o ano de Pater Gradivus completamente reciclado e pronto para a batalha em busca das minhas vitórias pessoais.
Portanto, espero um pouco mais de paciência dos meus amigos e amigas, meus filhos e filhas e principalmente para a mulher que esteve comigo em momentos de dificuldades e escuridão, pois agora volto renascido e livre.
Já aqueles que apostaram contra, e que buscaram me prejudicar e aos que me rodeiam, só posso mesmo cantarolar:
It's Too Late baby, It's Too Late... agora é tarde acabou...

quarta-feira, dezembro 19, 2007

carta para outra margem do Estinge

Carta de jacques Lacarrière, para o amigo morto, Lawrence Durrell, só para ilustrar o Larry, escreveu o Quarteto de Alexandria onde aborda ensinamentos gnósticos. os quatro livros são geniais, pois cada um deles conta a mesma história, só que com narradores diferentes.

Por diversas vezes escrevi sobre DurrelI, a pedido de, seus amigos franceses e ingleses, testemunhos, lembranças de encontros e reflexões publicados em diferentes revistas. Citarei aqui apenas um desses textos, o meu preferido, pois não é um testemunho, mas um adeus. Um adeus amigável e fraternal. Dirigi a ele, estas linhas algumas semanas depois de sua morte (posso Ihes assegurar que cada uma das palavras aqui pronunciadas e registradas é Verídica.

Carta a Lawrence Durrell

Agora que você alcançou a margem oposta do Estinge, o que separa o mundo em que vivemos por um tempo, daquele em que viveremos todos os tempos, já está mais do que na hora de eu escrever a carta que lhe havia prometido. Ao dizer "está mais do que na Hora" é evidente que estou falando apenas por mim, para quem o tempo é contado, enquanto que o seu, muito certamente, já deixou de sê-lo. Não sei se uma simples carta possibilita atravessar o Estige, ou, pelo menos, abordar-lhe a margem em vida, mas espero que ela consiga encontrá-lo, entre dois passeios herborizantes, nas pradarias de asfódelos.

Lembro que um dia, em Sommières, num daqueles dias em que conversávamos calmamente diante das árvores de seu jardim e de uma bilha avermelhada pelo rosé do Gard, nós, evidentemente, abordamos, como se diz, o tema Grécia. E você, de repente, exclamou:

- Jacques, quando se escolhe viver na Grécia, você sabe tanto quanto eu, não se tem noção de tudo a que se está exposto: não apenas a viver aqui como os gregos vivos, mas a conhecer, após a morte, a sorte dos gregos defuntos: a atravessar o Estige, nós também!

- Então - disse eu -, precisamos recompensar Caronte. Mas como encontrar um óbolo para pagar a passagem? Não existem mais óbolos hoje, nem mesmo na Grécia!

- Escute, Caronte não nasceu ontem! Desde que transporta os mortos de uma margem à outra, ele aprendeu os movimentos do câmbio e o nome das moedas. Tenho certeza de que não recusará um franco ou um dólar.

- Acho que é demais. Ele se contenta com dinheiro miúdo. Um pêni ou um centavo bastará para fechar negócio. Ainda que um centavo seja tão difícil de encontrar quanto um óbolo!

- Isto sempre foi para mim um grande mistério, que Caronte peça uma quantia tão modesta.

- E para que acumular o dinheiro, que está sempre se desvalorizando e mudando ao fim de cada regime? Ele nem tem tempo de gastá-lo: os mortos chegam dia e noite à beira do rio. Eu chego a me perguntar como ele faz para dormir.

- Caronte, meu caro Jacques, é completamente insone, senão não conseguiria muita coisa.

Houve um instante de silêncio sorridente: Caronte passou discretamente, fantasmagoricamente, olhando de soslaio para o garrafão de rosé, cujo nível indicava as águas baixas do Estige. E desapareceu, também com uma espécie de sorriso, o que permitiu que, tanto Larry quanto eu, constatássemos que já não tinha mais um só dente.

- Caronte não é tudo - continuei. - Depois há o cão Cérbero e a descida ao Hades.

- Estou certo, Jacques, de que quando se desembarca do outro lado, o mais difícil já passou. Pois o mais penoso, evidentemente, é mudar de margem, passar de um estado a outro, de um tempo a outro tempo. Parece que isso acontece a partir do momento em que se chega ao meio do rio. A tal ponto que, depois de pisar na outra margem, não se sabe mais de onde se veio.

- Mas como saber que não se sabe mais nada? Ninguém jamais voltou do Hades para nos contar. Salvo Orfeu, porque conseguiu seduzir Perséfone com melodias melífluas ou sentimentais. Mas ele também nada diz sobre o Estige.

- Nesse caso, eu não tenho nenhuma chance de voltar. Eu canto pessimamente. Aliás, pergunto-me o que é que eu poderia cantar para Perséfone. Ela também, assim como Caronte, deve ter evoluído. Tenho certeza de que ela prefere canções modernas às jeremiadas antigas. Honestamente, Jacques, você acha que ela apreciaria os Beatles?

Difícil responder de bate-pronto. Não conheço muito bem o gosto de Perséfone em matéria de música moderna. Mas ninguém como Larry para travar, assim, no tom mais sério do mundo, conversas substanciais sobre temas tão inesperados. Aliás, será tão terrível atravessar o Estige? Larry, Larry em pessoa, descreveu essa navegação com riqueza de detalhes, num texto surpreendente, magnífico, secreto, apaixonante, cheio de humor e esoterismo, um coquetel composto de um dedo de Hermes Trimegisto, dois dedos de Jonathan Swift, uma raspinha de Oscar Wilde, tudo misturado numa coqueteleira em forma de ânfora!

Ouça os conselhos judiciosos que ele dá à sua tia Prudence, que acaba de partir para a grande viagem, antes que ela embarque no Estige, conselhos que valem para todos nós:

"Quando despertares, estarás numa água clara entre duas margens separadas que se afastam até uma vasta linha de horizontes atormentados e encimados por nuvens recortadas. 0 silêncio é tamanho que o som de tua respiração parece extremamente sonoro, forte como um fole de forja. A barca avança com infinita lentidão: terás tempo de descer e examinar esse território, que é, sem dúvida alguma, o mais interessante que já viste. É um universo calcinado, petrificado, reduzido a carbono elementar. Entendes por que não há nenhum som? Não se ouve mais a seiva subindo nas árvores, não se ouve mais o pulso batendo na garganta dos pássaros. Não se ouve mais o verme cego engolir sua partícula de lama. Estão todos aí - as árvores, os pássaros, o verme -, mas, agora, minerais. Tudo está tão silencioso que as uvas brancas do vinhedo luzem como pérolas. E a árvore do fruto proibido está carregada de enormes globos de um minério banal. Aí, se olhares berra, verás que cada maçã é um EL Greco, cada baleia, um Cézanne. Não percas a barca que flutua na correnteza desse universo encantado, pois à sanções. Após alguns instantes nesse lugar, tu te sentirás um pouco mal, cuspirás em teu lenço fragmentos de poeira de diamante e crina de cavalo. Mas não te preocupes. E apenas teu fígado, que se transformou em granito mosqueado.".'

Interrompo aqui essa primeira carta. Estamos, os dois, inclinados sobre a água do Estige, vendo o rio correr, uma água que se tornou escura e lenta. E tia Prudence, na outra margem, avança, tropeçando, em direção a uma silhueta estranhamente parecida com a sua, mas que ela hesita em reconhecer à sua volta há tantas outras silhuetas que tremem e estremecem , e, no entanto, ouço nitidamente seus lábios pálidos articularem, num sopro: "Doctor Durrell, I presume?".

sexta-feira, dezembro 14, 2007

DENTES



O que os dentes estão fazendo num livro como este? Os dentes gregos seriam diferentes de todos os outros dentes do mundo? Claro que não. Menciono-os aqui porque, nos meus tempos de liceu, ao traduzir a Ilíada, reparei numa curiosa expressão usada para dizer a uma pessoa que ela havia ido longe demais em suas palavras: "Infeliz! Que palavra escapou do redil de teus dentes?".

O redil dos dentes! Eu logo imaginava a malta ou o rebanho das palavras, ovelhas ruidosas e fonéticas, empurrando por detrás da cortina dos dentes e passando a conta-gotas, ou melhor, a conta-palavras! Estranha - e figurada - concepção da linguagem, cujo significado implícito parece ser o de que as palavras só têm sentido e alcance uma vez pronunciadas ou proferidas abertamente. Daí palavras simplesmente pensadas mas nunca proferidas não terem existência própria e não poderem ser levadas em consideração. São como um pensamento não formulado, um desejo amordaçado, um gado retido aquém do imenso horizonte da linguagem manifesta.
A ofensa, o insulto eventual, a falta ou o delito começam além do redil dos dentes, além do aprisco palatal! Os gregos - refiro-me aos gregos antigos e, particularmente, aos gregos dos tempos homéricos - não davam, portanto, importância alguma ao pensamento íntimo do sujeito falante, qualquer que fosse sua natureza, enquanto ele estivesse em estado de pensamento mudo. Vê-se logo a diferença, e mesmo o abismo, que separa essa atitude daquela dos futuros cristãos.
Para os cristãos, a falta - ou o pecado - começa na própria fonte da linguagem, no mais íntimo do pensamento ou do desejo que a sustenta. Ver passar uma bela mulher, por exemplo, e começar a desejá-la, é já e em si um pecado. Para os cristãos, o pecado mora no seio dos pensamentos, como o verme na polpa da fruta, sem que seja preciso manifestá-lo. Ele é o irmão gêmeo do silêncio interior. Que abismo entre isso e a tolerância, a inocência do paganismo, para o qual nenhum pensamento não formulado publicamente pode ser repreensível!
Todo desejo que permanece ou tenha permanecido desejo está aquém do pecado, da falta. 0 redil dos dentes existe para impedir que ele se torne ofensa, provocação, que se transforme em ato. Aqui, naqueles tempos homéricos e talvez também em tempos mais tardios, os pensamentos - mesmo os mais impuros ou agressivos - guardam sua inocência e seu mistério como tantas ovelhas dóceis silenciosamente passando por detrás do redil dos dentes.
( Do Livro Grecia Um Olhar Amoroso de Jacques Lacarrièle)

Justiça


Pois é enquanto os grupinhos pagãos ficam brigando...

O Conselho Nacional de Justiça abriu ontem (semana passada) processo disciplinar contra o juiz de Sete Lagoas (MG) Edilson Rumbelsperger Rodrigues, que qualificou a Lei Maria da Penha de "conjunto de regras diabólicas" em várias sentenças nas quais negou proteção a mulheres vítimas de violência doméstica.
A decisão foi unânime. Os conselheiros entenderam que o juiz excedeu-se na linguagem utilizada nas decisões judiciais.
Se ao final do processo ele for condenado por desvio de conduta, a punição máxima será a aposentadoria compulsória, com remuneração. Rumbelsperger Rodrigues prestou explicações ao CNJ. Disse que fez análise "filosófica" sobre a lei para não se ater a análise puramente jurídico-constitucional e negou intenção de agradar ou ferir alguém.
O ministro do STJ (Superior Tribunal de Justiça) Cesar Asfor Rocha, que integra o CNJ como corregedor-nacional de Justiça, começou a examinar o caso há um mês, depois que a Folha publicou reportagem revelando o teor de uma sentença de 12 de fevereiro último.
"Para não se ver eventualmente envolvido nas armadilhas dessa lei absurda, o homem terá de se manter tolo, mole, no sentido de se ver na contingência de ter de ceder facilmente às pressões", afirmou o juiz.
Ele disse ainda:
"A desgraça humana começou no Éden: por causa da mulher, todos nós sabemos, mas também em virtude da ingenuidade, da tolice e da fragilidade emocional do homem (...) O mundo é masculino! A idéia que temos de Deus é masculina! Jesus foi homem!"
A Lei Maria da Penha (nº 11.340/2006) aumentou no país o rigor nas penas para agressões contra a mulher no lar, além de fornecer instrumentos para ajudar a coibir esse tipo de violência.
A corregedoria do Tribunal de Justiça de Minas Gerais havia arquivado pedido de abertura de processo contra Rumbelsperger Rodrigues afirmando que nenhum juiz pode ser prejudicado por opiniões expressas em sentença.
Ontem, o CNJ aprovou a revisão da decisão do TJ-MG. Os conselheiros disseram que a imunidade do magistrado não é absoluta. "O juiz, como todo agente público, está sujeito aos preceitos éticos, inserindo-se aí a vedação de uso de linguagem excessiva em seu discurso judiciário", afirmou Asfor Rocha.
Na mesma linha, o conselheiro do CNJ e ministro do TST (Tribunal Superior do Trabalho) João Oreste Dalazen afirmou: "Não há direito absoluto para constituir sinal verde à destemperança verbal".
A Folha não conseguiu localizar o juiz no começo da noite de ontem. No fórum de Sete Lagoas e no Tribunal de Justiça de Minas Gerais, ninguém foi encontrado para falar sobre o assunto.


Colaborou FELIPE BÄCHTOLD, da Agência Folha

quinta-feira, novembro 29, 2007

Caetano Veloso - Eu Sei Que Vou Te Amar

Me assusto em saber, que ainda que seja por meia hora, a sua consciência viaje no éter e que corro o risco de perder seus pensamentos no imenso infinito. Porém uma coisa me consola, já viajamos pelo espaço e percorremos o infinito e ainda assim no imenso universo, nos encontramos e nos mantivemos juntos.
Somos deus e deusa quando largamos nossos corpos e como no mar de Netuno e Salácia vamos nos encontrar e caminhar juntos.
Então na hora em que sua consciência se perder no ar, olhe para os lados e você vai me ver, vou pegar na sua mão e te trarei de volta.

Pelos Deuses, por Maya e por nós

quarta-feira, novembro 28, 2007

Díke e Hýbris a procura da justa medida.



Quando estudamos a mitologia grega muitas vezes esquecemos do equilíbrio que devíamos ter entre Díke a Piedade, que diferente do sentido cristão onde é vista como dó, significava para os antigos "Devoção" aos deuses e as leis divinas e a Hýbris é a ausência disso, é o Desmedido Orgulho e o Exagero e Excesso de Devoção que ultrapassa o metron (a medida de cada um).

Devemos portanto servir aos deuses de acordo com o nosso conhecimento e capacidade, ir alem disso cairemos nos braços de Ate (o engano) e exaltaremos nossa Hýbris e a inveja nos acompanhará e seremos abandonado por Aidós (a temeridade) e fatalmente cairemos nos braços de Nemésis, aquela que nos exalta e eleva, para em seguida nos derrubar, afinal, dói bem mais cair das alturas.

Um exemplo Clássico disso é o de Aquiles o grande herói da guerra de Tróia, cujo destino era morrer após a derrubada de Tróia coberto de todas as Glórias.

Ao matar Heitor, perdeu a Díke e exaltou a Hýbris, arrastando por três vezes o corpo do príncipe em torno da cidade troiana e negando o seu corpo a terra. O enterro de um Heroi é direito divino e o filho de Peleu, contrariando as Leis de Têmis (vejam Antígona, que luta pelas leis divinas contra as leis dos homens), deixou seu corpo como pasto as feras e pássaros carniceiros. Por sua Hýbris, quase pôs toda a guerra a perder dissipando sua glória e seu direito a tomada das muralhas e prolongando a guerra por mais um ano. Apolo aquele que tem em seu templo o aviso para os desmedidos e violentos: Apreenda a conhecer a ti mesmo, incorpora em Páris e abate Aquiles com uma só flecha, no calcanhar. Lembrando o que nos diz Aristóteles em sua Retórica ( 2,21) ou no ditado latino "memento, homo, quia pulus es" Lembra-te, homem, de que és pó.

Vários textos nos advertem contra a desmesura:

O poeta Teógnis (século VI a.c.) adverte seu amigo Cirno: "Nada persigas em demasia; um meio termo é a melhor de todas as soluções."

Ésquilo, na tragédia os Persas, traz do Hades o fantasma de Dario para reclamar da desmesura de seu filho Xerxes ao unir a Europa e Ásia, com sua ponte de barcos, contrariando a vontade dos deuses que criaram os continentes separados e Este declama no teatro de Dionísio em Atenas:

"E os cadáveres amontoados, na sua linguagem muda, revelarão aos olhos mortais, até a terceira geração, que o homem não deve Ter sentimentos orgulhosos, pois a Hýbris, ao amanhecer, produz espigas de erro e a seara ceifada será tão somente de lágrimas."

Pindaro ( seculo V-VI a.c.) define com precisão que o homem só pode se erguer até a sua limitação, controlando a sua Hýbris:

" Seres Efêmeros! Que é cada um de nós?
Que não é cada um de nós?
O homem é o sonho de uma sombra! ( Pitícas, 8, 95-97)

Por estas, podemos perceber os malefícios e o perigo que representava para os gregos ( e para nós) o arroubo provocado pela Hýbris.

quinta-feira, novembro 22, 2007

O Rapto de Ganimedes

Júpiter foi, Júpiter é, Júpiter será! Ave Júpiter!
O Rei dos Deuses ardeu de amor pelo frígio Ganimedes, da linhagem Príamo, e viu em si algo que não vira antes, algo que ficara perdido no passado, já que se criara isolado e escondido. Viu o que jamais vira em si próprio, a beleza da juventude e se apaixonou pelo que podia ter sido.
Criado para vingar sua mãe que não pode lhe dar afeto, pois devia ignorar sua existência ou nada do planejado seria concluído. Júpiter não teve infância ou juventude, nascera para ser responsável, devia destronar Saturno, libertar seus irmãos, governar o mundo e espalhar seu sagrado sêmen criando linhagens capazes de governar os homens. Nunca pudera amar sem o compromisso de fertilizar, nunca pudera irresponsável, ser fecundo era sua sina.
Porém quando o mundo estava pronto, vencidos os Titãs, Gigantes e Tifon, o Olimpo povoado de Deuses que controlavam todas as forças de Gaia e a raça dos Homens tinham líderes capazes de leva-la a um glorioso destino, no momento que suas paixões se acalmavam. Ele relaxou e se esqueceu que a ultima flecha, das doze douradas que Cupido reservara para si, ainda não fora disparada, ele olhava e admirava a sua criação, quando seus olhos pousaram em Ganimedes, que pastoreava o gado de seu pai Trós.

Observava a graça do caminhar despreocupado do rapaz, o seu andar suave e sua corrida de ninfa que parecia flutuar sem quase tocar o chão. O corpo esguio e seus cabelos abundantes, que escapavam do gorro frígio que cobriam o alto da cabeça, flutuavam ao vento. O Ilíada tinha a carne macia e a pele sem jaça, como o das deusa e gestos suaves enquanto dançava ao som da flauta dos pastores que seus lábios tocavam suavemente.
Admirado e elevado com sua criação, desculpava todos os erros humanos que seus filhos cometiam, por este que lhe parecia a glória de todos os humanos e que só se repetiria dali a poucas gerações em Páris, nascido da mesma estirpe. Enquanto divagava, descuidou-se e não percebeu que o pequeno demônio que tinha poder sobre os deuses e os homens, beijava a última flecha destinada a Júpiter, aquela que faria com que ele fizesse o que nunca havia feito, esquecer a sua natureza procriadora, ser irresponsável com seu próprio destino e a amar sem procriar. E antes que se desse conta, Cupido disparou sua flecha mais cara, a que subverteria a ordem do cosmo direcionado ao coração do maior dos saturnidas, o trovejante Júpiter.
O Deus dos Relâmpagos Noturnos (Iupiter Summanos) não esbouçou nenhuma reação ao ser atingido no peito, apenas suspirou, e num rompante criou asas e transformado em uma águia se precipitou dos céus num vôo rapace e raptou o pequeno troiano, levando-o ao cume do monte Ida onde ficava o templo de sua mãe e lá paralisou todo o universo para desfrutar sua presa.
Voltando a sua forma sobre humana, Júpiter se dirigiu a Ganimedes com esta fala:
- Ea, Ganimedes; já que chegamos onde eu tinha imaginado, me dá um beijo agora, para que vejas que não tenho bico encurvado, garras afiadas e nem tampouco asas, como me apresentei a ti, com aspecto de pássaro.
- Homem ! não eras uma águia a um momento atrás quando me raptaste do meio de meu rebanho? Como te caíram aquelas asas e te apresentas diferente agora?

- Menino , não estas vendo um homem, nem viste uma águia, eu sou o deus de todos os deuses, que me transformei oportunamente.

- É o Senhor? O Senhor afirma ser aquele que ainda outro dia que fez chover granizo sobre o meu rebanho matando algumas ovelhas? É aquele de quem dizem mora nas alturas e que faz tanto barulho com suas trovoadas? A quem meu pai sacrifica meus melhores carneiros? E se é assim, que mal eu lhe fiz para que me tire do meu rebanho, deixando meus carneiros desamparados e assustados? Ah senhor dos deuses! Por favor me devolva rapidamente para que eu proteja o rebanhos antes que os lobos caiam sobre eles como caístes sobre mim!

- Você se preocupa com os carneiros, quando já te fiz imortal e que agora e um dos deuses? - Disse sorrindo o Trovejante.
- Como? Quer dizer que o senhor não vai me devolver para a terra? - Assustou-se o ilíada.
- Claro que não! Afinal por que eu me transformaria inutilmente em águia? Oras garoto tenho mais o que fazer além de assustar meninos, por mais lindos que eles sejam...

- Que merda! Logo meu pai vai me procurar e quando me encontrar vai me dar uma dúzia de cascudos por eu ter abandonado o rebanho, ale das broncas que receberei da minha mãe.
Não é possível. Como ele iria te achar ?

- Vamos fazer o seguinte, disse o garoto, Se o senhor me devolver agora, eu prometo que separo meus melhores carneiro e faço um grande sacrifício para o Senhor. Tenho quatro carneiros de três anos que são maravilhosos...

- Para com isto menino bobo, pare de ser inocente! É simples, entenda o seguinte, eu o Senhor de todo o mundo te raptei e não vou te devolver. Olha, Ganimedes, se despeça dos campos, dos rebanhos e se esqueça da vida que você levava, porque agora você é um Deus imortal e tenha certeza teu pai, sua mãe e até mesmo os idiotas dos seus carneiros irão se beneficiar muito mais da sua divindade, do que simplesmente desfrutar da sua companhia humana. Poderá fazer muitos favores para sua pátria, para o seu pai e alem de tudo dos céus será muito mais fácil cuidar destas ovelhas.
- Hunmn pensou o garoto.
- E pode se esquecer de tudo que comias, não vai mais se alimentar de queijo e leite, a partir de agora você vai comer Ambrosia e beber Nectar, que você mesmo servirá aos deuses. Acorde agora você é um Deus! E vou fazer com que sua estrela brilhe com muita formosura, você não vai envelhecer, não vai mais se cansar, e nunca vai morrer. Em outras palavras você vai ser feliz muito feliz.
- E quando eu sentir vontade de jogar e brincar? quem vai brincar comigo? Nas encostas do Ida éramos muitos da mesma idade, tem meninos no Olimpo ?
- Cupido vai brincar com você e também Juventa. Bem creio que existem vários deuses que vão gostar de você e não deixaram de jogar contigo.

- E no que vou poder ser útil ? tem rebanhos no Olimpo?

- Não, você vai nos servir vinho, néctar e guardará a ambrosia, você vai cuidar dos banquete e vai ter a ajuda de Juventa, aquela quem vocês chamam de Hebe.
E com quem eu dormirei a noite, estou acostumado a dormir abraçado com as ovelhas, que eu vou abraçar ? Cupido ?

- Não ! é precisamente por isto que te raptei, você vai dormir comigo, vamos dormir juntos!
O senhor já não é adulto? Porque precisa dormir com alguém? Porque prefere comigo?
- Oras, porque você é um menino lindo Ganimedes.

- De que adianta minha beleza se o senhor vai estar de olhos fechados, dormindo.
Ganimedes, sua beleza me enfeitiçou e e vou te ensinar algumas coisas que farão que durmamos mais tranqüilos.

- Tranqüilos ??? vou logo avisando: meu pai, se irritava comigo sempre que eu ia dormir na cama dele, dizia que não conseguia dormir comigo, dizia que eu dava voltas e mais voltas na cama, falava dormindo e lhe dava patadas e chutes enquanto dormia. Sempre que eu ia pra cama dele ele me levava pra cama da minha mãe. E continuou:

- Se foi pra isto que o senhor me raptou, é bom me devolver agora, antes que me atires do céu por seus problemas com insônia, porque sem duvida eu vou molesta-lo dando voltas sem para na cama.

- È isso precisamente o que eu quero que me descubra e me acorde varias vezes por noite, para que eu te abraces e beije a noite toda.

- Então o senhor já sabe... não vai reclamar depois. E eu tenho sono pesado e vou dormir enquanto o senhor me abraça e beija.

- Então você já sabe o que deve fazer. Vamos para o Olimpo, onde Mercúrio, vai lhe dar o Néctar e a Ambrosia e lhe ensinar a servir e como me oferecer as taças... o resto vamos aprender á noite... vai ser divertido eu lhe prometo.

- É bom que seja, porque se eu não gostar vou chorar e fazer bico e minha mãe disse que fico muito feio quando fico irritado e faço bico... aí... o senhor vai Ter que me por no colinho e me fazer muito carinho...
- E seguiram juntos pelos ares em direção ao Olimpo.

Procurando Ganimedes

"Nenhum rival pôde evitar que São Sebastião se tornasse um ícone do culto ao corpo masculino e do homoerotismo, nem Ganimedes, nem Apolo, nem Antinoo e nem mesmo São João Batista o conseguiu. São Sebastião foi pintado e esculpido centenas de vezes sendo o preferido por artistas que provavelmente não eram homossexuais.

O surpreendente êxito iconográfico de São Sebastião remonta a Alta Idade Média. Uma peste se espalhou por Roma no Século VII e o povo acreditou que Deus enviava aquela epidemia como um arqueiro que lançava suas flechas ao acaso e acreditavam que como São Sebastião havia sobrevivido ao martírio das flechas, ele morreu depois por lapidação (mas, isto foi esquecido pela Igreja Católica) somente ele poderia salva-los da praga enviada através das setas divinas. Suas imagens se espalhavam em altares, afrescos e até mesmo em medalhas que eram usadas no pescoço.

Já nesta época existiam pintores como Perugino e Botticeli, que o usaram para exaltar a beleza e juventude da nudez masculina, independente da missão terapêutica do santo. Porém a grande revolução do tema ocorreu no Século XII no começo da era barroca, quando aparecem as primeiras visões de adolescentes nus e desfalecidos pintados com o único fim de agradar aos olhos. Se esqueceram completamente que Sebastião havia sido um capitão da guarda pretoriana do Imperador Diocleciano e o representavam como um efebo, mais afeito a languidez do que às armas. Guido Reni um dos retratistas mais sensuais de S. Sebastião, continua representa-lo de pé, porem já não se trata de glorificar sua resistência ao destino, mas sim explorar a sensualidade masculina, Os braços acima da cabeça e amarrados a arvore, descobrem seu Torax nu e a suavidade de suas carnes, oferecendo-se assim plenamente a contemplação estética do observador.

Por que no Século XII um soldado vigoroso e marcial um oficial romano é convertido num efebo erótico? Por que os barrocos viram no mártir do século III uma figura conveniente para a sua arte?


Naquela época as pestes voltavam com maior vigor e devastavam varias cidades, e ao representar o santo nestas posturas desfalecidas e dolentes em nada lembravam o valor do amuleto que foi usado no século VII.


Não podemos nos esquecer que nos séculos XI e XII o fenômeno do amor romântico e as trocas dos menestréis varrem a Europa como outra peste e na pintura o espetáculo da beleza, da dor e do êxtase vão estar intimamente relacionadas. O corpo do santo que antes era retratado parcialmente vestido agora era representado quase completamente nu.

"Mata-me, faça-me Morrer" escrevia Tereza D’Ávila, quando narrava seus encontros com seu amante divino.D’Annunzio, que compôs um poema sobre São Sebastião, colocou estas palavras na boca do santo:
" Eu digo, eu digo, quem mais profundamente me fere, mais profundamente me ama."

Em ambos os casos, a mesma retórica sadomasoquista e a mesma busca do prazer na dor. A época era propicia, doenças e guerras devastavam a Europa, interessava mostrar o prazer no martírio e que a dor além aliviar a culpa, podia levar ao êxtase.

Tanto tormento, só pode levar a dois caminhos: ao mais estrito ascetismo ou a busca frenética do máximo do prazer que pode desfrutar o homem em seu curto período de vida. Se a morte é eminente, temos pressa de desfrutar a vida. As confusões da História e a angústia que estas produzem são refletidas no tema de São Sebastião, o que podemos chamar de um pessimismo hedonista. Um sentimento precário da existência, uma consciência aguda da fragilidade das coisas e da brevidade do tempo, amalgama do fúnebre com o voluptuoso, o abandono e o êxtase, uma sensualidade tremula. A união da morte com o amor, de Eros e Tânatos, que fica magnificamente representada na figura do jovem que padece o suplicio. (Resumo um trecho do livro de Dominique Fernandez; El rapto de Ganimedes, Editorial Tecnos, Madrid,1992)."

Creio que foi neste ponto que reencontrei Ganimedes, não exatamente na beleza adolescente ou plástica, mas no sentimento da Fatalidade (no sentido de destino) o de se entregar ao destino ainda que este seja adverso. Vejo a aceitação e a impossibilidade do humano perante aos deuses e a entrega sem resistência ao inevitável.

quarta-feira, novembro 21, 2007

Quando o Amor não Morre ...


Filemon e Baucis, um casal de velhinhos que em tempos difíceis foram os únicos a oferecer hospitalidade a Zeus Xenos (estrangeiro) que depois de visitar mais de mil casas juntamente com Hermes, e não serem recebidos em nenhuma delas, bateram no casebre onde estes anciões moravam desde a sua juventude.

Chovia e logo os anciões acolheram os deuses pensando estar acolhendo estrangeiros, que visitavam a sua terra. Logo cobriram os toscos móveis com peles curtidas e avivaram o fogo do braseiro, para aquecer os visitantes. Enquanto Filemon, servia-lhes um trago de vinho para que se aquecessem, Baucis acendia o fogão e prepara um repolho com ervas e um pedaço de um toucinho para oferecer aos hospedes.

Filemon, assustou-se ao ver que seu copo e o dos deuses se enchiam sem que ninguém os servissem e o vinho que estava no seu copo era em muito superior ao que lhes tinha oferecido, falou com sua esposa sobre o prodígio e ela disse para que matasse o ganso que era o único animal que possuíam, pois estes viajantes deviam ser emissários dos deuses.

Bem, enfim o ganso mais rápido que o velho, refugiou se entre as pernas de Zeus, e este o proibiu que o matassem e revelaram as suas identidade: somos Deuses e vamos leva-los para o alto da montanha e lá terão uma bela morada e alguns escravos para que tenham uma vida melhor em sua velhice, enquanto castigamos todo o restante desta ímpia aldeia.

Não, imploraram os anciões com lagrimas nos olhos, a vida aqui tem sido muito difícil, muitos roubos tem acontecido e a fome se espalha nos campos, se eles não os receberam foi por medo e miséria. Também não queremos uma vida melhor, já estamos velhos e tudo o que temos são nossas lembranças, foi nesta aldeia que nos conhecemos, aqui nos casamos, tivemos filhos, e os vimos partir ou morrer. Toda nossa vida está nesta aldeia, se a destruírem, destruíram também nossas lembranças de felicidade. Imploramos que não destruam nem castiguem nossos vizinhos.

Zeus coçou suas barbas, pensou e disse:

Que assim seja, mas a sua cabana vai se transformar num templo e vocês dois serão meus sacerdotes, seu vizinhos deverão honrar meu templo e alimentar aos dois. E nisto o telhado de palha amarelou até se transformar em ouro, as paredes viram mármore e o terreno em volta um jardim magnifico.

E para agradecer a vocês estou disposto a realizar os desejos que vocês fizerem, portanto digam o que desejam.

Filemon pensou e disse: Pedimos uma vida ainda mais longa, para que possamos ser seus sacerdotes e honrar seu nome, e também queremos morrer ao mesmo tempo pois sabemos o quando será doloroso se eu tiver que enterrar Baucis ou ela a mim.

E assim foi feito, viveram ainda muito tempo e um certo dia, Filemon percebeu que brotavam folhas em seu corpo e virou se e viu que acontecia o mesmo a sua esposa. Olharam um para o outro e antes que seus rostos fossem cobertos pelas folhas se miraram nos olhos e falaram a uma só voz: Adeus, Meu amor !

E foi a ultima coisa que disseram e durante muito tempo dois enormes e frondosos carvalhos guardaram a entrada do templo de Zeus Xenos !

Quando existe o amor, não existe nem velhice nem morte

quarta-feira, novembro 14, 2007

Porque eu escrevo?


As vezes eu fico imaginando o que acontecem com os textos que jogo na rede, será que servem para alguma coisa ?

Bem eu com certeza sei que para mim servem, afinal para escreve-los eu faço uma série de consultas, leio ou releio livros e estes são como labirintos a cada leitura descubro outros corredores, investigo alguma citação que não havia me interessado, avivo na memória alguns pontos esquecidos. Creio que escrever me faz bem e se assim é, porque me preocupar se os outros estão aproveitando algo?

Não sou cristão, não tenho vocação missionária (nem o paganismo tem) e nunca pretendi catequizar ninguém, como já falei anteriormente acredito que os textos que coloco são como garrafas jogadas no mar, nunca sabemos o que vai acontecer com elas, podem ficar anos sendo levadas pelas ondas até aportarem em alguma praia, se alguém vai ler a mensagem... nunca vamos saber, e se alguém vai fazer uso do que escrevi é ainda mais difícil.

Mas continuo escrevendo, creio que é como que se me obrigando a aprender mais, vasculhar a biblioteca em busca de uma referencia que queria colocar no texto ou para tirar alguma duvida. A mitologia me fascina, muitas vezes estou buscando algo especifico e me perco nos livros lendo e revendo coisas que não pensava no momento e chego mesmo a esquecer o que estava escrevendo e continuo lendo paginas e mais paginas sobre coisas que nem me passavam pela cabeça.

O fato de escrever na rede, embora as vezes eu ache inútil, sempre me traz muitos benefícios além o de aumentar meu conhecimento, de certa forma apesar do ato solitário da leitura e escrita, publicar os textos aumentou e muito meu circulo social, pois através da rede conheci várias pessoas, muitas mesmo. È claro que muitas destas passaram por minha vida sem deixar nenhum rastro, outras porém acabam fazendo parte da minha vida. Deve ser a tal da peneira, que deixa passar pelo crivo toda a areia, retendo apenas o que é metal precioso ou gemas. Então, penso que estas pessoas que passaram pela joeira, são realmente o joio, e as que ficaram são realmente trigo, que nos alimentam e nos fortificam. E se não fosse o ato de escrever eu teria perdido estes preciosos grãos.

É claro que entre os grãos perfeitos, os diamantes e o ouro que restou na peneira, também ficaram algumas pedras brutas, possíveis jóias que precisam de lapidação e algumas destas venho lapidando há anos e me dão uma imensa alegria ao ver que começam a brilhar, que com algumas centelhas e lampejos iluminam as trevas da ignorância que é característica do nosso tempo.

É por isto que continuo escrevendo, não por que seja bonzinho (isto não sou mesmo), nem para angariar discípulos (não tenho muito saco para isto), escrevo para ganhar conhecimento e conhecer pessoas e isto os deuses tem me dado, se tivesse medo de escrever errado ou repassar conhecimentos, não encontraria as pessoas maravilhosas que conheço, nem faria parte da tribo que me acolheu.

Escrevo porque sou hedonista e escrever já me deu grandes prazeres.

terça-feira, novembro 13, 2007

Ubi tu Gaius ego Gaia

Embora as feministas costumem resmungar (e elas resmungam muito) esta formula dita pela noiva, que fecha o casamento romano em nada tem de dominação patriarcal ou domínio machista. Ela simplesmente fecha um acordo onde o marido que aceitam não se tornará seu amo mas sim seu par. São a partir daí Janus, as duas faces de um mesmo ser. Ela nada tem a ver com a união carnal nem mesmo com a comunhão romântica de dois corações, mas sim, com o início de uma "societas", uma sociedade que ultrapassa cada um dos cônjuges, tanto por suas consequências, como por sua própria natureza. O casal é por si só um novo ser.

Este caráter do matrimonio romano, que considera o casal como uma realidade em si, de certo modo transcendente, aparece claramente na condição de um par sacerdotal. Assim como o do flamen e da flaminica um sacerdócio antiquíssimo que só podia ser exercido por um patrício casado, que remonta o componente ariano da urbe romana.

O casal a partir do casamento passavam a ser os sacerdotes do culto doméstico, levado em alta conta pelos antigos romanos. Apesar do culto oficial da urbe (cidade) existia a religião de cada gens (familia patrícia) com seus próprios deuses (antepassados) os antepassados carnais e os gênios familiares (daimons ou exús). Até o casamento tanto o Homem quanto a Mulher tinham como sacerdotes deste culto seus pais, e depois do casamento assumiam a condição de sacerdotes da familia que ali se iniciava, e seguiriam a religião da gens do marido. ( embora mais tarde haveria o casamento sem "manus" onde a mulher continuava devotada a religião da gens paterna.

Os antigos romanos se casavam muito jovens a idade legal para o casamento era doze anos para as mulheres e quatorze para os meninos em bora para os meninos este prazo se dilatava até os dezoito anos. A idéia é que a noiva não fosse apenas pura fisicamente, mas que tivesse também a pureza moral e não fosse expostas a conduta e aos cultos da família de seus pais, para assim se integrasse totalmente ao marido.

O casamento patrício era chamado de "confarreatio" e apresentava ritos que conservavam valores mágicos e outros que eram apenas herança incompreendida do passado distante. Em sua maioria tinham o objetivo de proteger a noiva neste momento importante da sua vida.

A cerimonia começava na véspera, quando a noiva abandonava suas roupas infantis e era vestida com uma túnica branca chamada de "tunica recta" (túnica reta) era uma túnica tecida em tear à moda antiga por um tecelão que trabalhava de pé ( num momento tão importante era melhor seguir as antigas tradições que arriscar uma inovação). A faixa que prendia a túnica à cintura era amarrada com um nó especial chamado "nó de Hercules" que no dia seguinte o noivo desataria.

Seus cabelos eram penteado de acordo com os rituais antigos: Uma mulher bem casada e virtuosa repartia os seus cabelos em seis tranças com a ajuda de uma "Hasta Caelibares" (uma lança de cabo curto com ponta de ferro afiado) que segundo Plutarco remetia a Juno a protetora dos casamentos, que em algumas configurações era uma deusa guerreira. O penteado era imutável, as seis tranças presas à testa com pequenas tiras de tecido e depois cobertos com o Flammeum, véu cor de laranja que caia sobre os ombros emoldurando o rosto – o Flammeum véu usado pelo flamem e a flaminica (cujo divórcio era proibido) tinha a cor de laranja que representava o amanhecer o começo de um novo dia – na manhã seguinte os convidados se reuniam na casa da noica onde faziam sacrifícios e se ouviam os "Auspices" (adivinhos, oráculos) e depois vinha o casamento propriamente dito as declarações e consentimento de ambos, cujas mãos, uma mulher "a Pronuba" unia solenemente. Este gesto, "Dextratarum Junctio" manifestava e simbolizava a união dos conjuges, que a partir disso se transformavam em um só ser. Pedia-se então aos deuses que abençoassem a união. Estranhamente os deuses invocados era um masculino e quatro femininos: Jupíter pelo testemunho dos céus, Juno a protetora dos casamentos, Vênus para a paixão, Fides a deusa da palavra empenhada e Diana a parteira para que viessem os filhos. Estas invocações nos mostravam que a mulher era a mais dotada dos poderes divinos.

Depois de outro sacrifício e banquetes se esperava até o anoitecer e o aparecimento da estrela Vesper.

Quando os amigos do noivo, talvez para lembrar um ato criador de Roma raptavam a noiva como os primeiros romanos fizeram com as Sabinas. A noiva fingia estar assustada, resistia e se refugiava nos braços da mãe, de onde era arrancada e seguiam em cortejo guiado pela "Pronuba" até a casa do noivo. Este alegre cortejo era acompanhado por cantos obscenos, pelo valor apotropáico para afastar o mal olhado e estimular a fecundidade do casal.

No cortejo a noiva era acompanhada por 3 animais que tivessem pais vivos e um deles carregava uma tocha de espinheiro-alvar e os jovens amigos do noivo tambem carregavam tochas para iluminar o cortejo. A noiva era acompanhada por duas criadas que levavam nas mãos uma roca e um fuso, simbolizando o trabalho doméstico da futura senhora – este era o único trabalho doméstico exigido da esposa nascida livre, até mesmo na casa de Augusto as suas tunicas eram fiadas e tecidas pelas mulheres da família.

Com a chegada do cortejo a casa do noivo, a noiva fazia preces as divindades do limiar, untava os batentes com óleo e prendia tiras de lã e depois erguida pelos rapazes ( para evitar um tropeço de mau presságio) atravessava a soleira e era então apresentada as divindades da casa.

O noivo que a esperava no Atrium oferecia-lhe Água e Fogo, os dois elementos vitais e indispensáveis aos ritos sagrados. E finalmente a jovem noiva dizia a formula que é o titulo desta postagem "Onde Fores Gaius, Serei Gaia" e começando sua nova vida oferecendo três moedas: uma ao marido, outra aos deuses do lar e a terceira aos lares na encruzilhada mais próxima.

Fonte: O Amor em Roma e A Vida em Roma na Antiguidade do Pierre Grimal e Curso de História Roma de André Alba

segunda-feira, novembro 12, 2007

Mimar Você

Eu adoro mimar voce

Minha Mulher


Quem vê assim pensa que você é muito minha filha
Mas na verdade você é bem mais minha mãe
Meu bichinho bonito
Meu bichinho bonito
Meu bichinho bonito
Tudo é mesmo muito grande assim
Porque Zeus quer
Minha mulher
Minha mulher
Minha mulher
Quem vê assim pensa que você é muito minha filha
Mas na verdade você é bem mais minha mãe
Meu bichinho bonito
Meu bichinho bonito
Tudo é mesmo muito grande assim
Porque Zeus quer
Minha mulher
Minha mulher
Minha mulher
Quando eu for velho
Quando eu for velhinho
Bem velhinho
Como seremos?
Como serei?
Como será?
Meu bichinho bonito
Meu bichinho bonito
Meu bichinho bonito
Tudo é mesmo muito grande assim
Porque Zeus quer
Minha mulher
Minha mulher
Minha mulher

(Caetano Veloso – Minha Mulher)

quarta-feira, novembro 07, 2007

MARS VLTOR


O culto ao Divus Julios juntamente com o de Venus Genitrix visavam firmar a conexão dos governantes da Roma Imperial com os deuses da Cidade. Julio César depois da sua Vitória contra Pompeu ergueu no Fórum Romano um templo a Venus Mãe exatamente para homenagear a si mesmo e a "gens" a qual pertencia, a dos descendentes de Iulo (Ascanio filho de Enéas e neto de Venus) a Gens Iulios. Augusto ao elevar Júlio César á divindade reafirmava isto. Porém quando levantou o Grande Templo a Marte Ultor, Augusto consolidou a sua família (gens) ao deus fundador da Cidade.


Marte Ultor é o Marte vingador do sangue de Iulo e seu templo foi erguido depois que o ultimo dos assassinos de Júlio César foi morto, para mostrar que era da vontade dos deuses que o sangue de César fosse vingado.


Ultor é a palavra latina para Vingador e Marte Ultor é sua pesonificação divina. Ele é amante de Nemésis (Ultrix) e é acompanhado por seus filhos Fobos e Deimos (Medo e Terror) e pelas Fúrias enquanto caminha pela terra buscando a vingança de quem ofende aos deuses e a sua linhagem. É o ultimo epíteto de Marte, pois não existe mais nenhum após ele. Quando as leis humanas não condenam a um transgressor das divinas leis do universo regidas por Têmis é a Marte Ultor que vai cobrar a divida.


Aparentemente aterrador, só deve ser temido por quem despreza ou tenta se comparar aos deuses, para estes a sua espada vingadora decepa a cabeça logo apos ele Ter confirmado sua identidade no pergaminho que carrega. Para os demais ele se comporta como um soldado, é amigo dos amigos e os protege.


Ao contrario da Grécia que via em Ares um Deus estrangeiro proveniente da Tracia e como estrangeiro tratado como bárbaro, o Marte romano tinha varias configurações e era adorado em vários nomes e variadas funções. De Deus fundador da Cidade na forma de Quirino (um deus sabino representado por uma lança - Quiris). O culto foi criado por Numa Pompilio o 2º Rei de Roma na figura de Rômulo, o fundador da cidade que foi colocado no rol dos deuses da cidade como Marte Indígite (classe de deuses, que tinham apenas uma função e que eram os deuses originais de Roma – dii Indigetes). Quirino era epíteto de Marte e Jano, Augusto quando Imperador adotou este nome. As Quirinais, festas em honra a Rômulo, transformado em Quirino, eram celebradas em 17 de fevereiro.



Gradivus, Pater Gradivos ou Rex Gradivos cuja a raiz parece ter vindo de grandis, grandire, ou seja, crescer. É o deus que faz crescer as plantações, assim como os romanos o Mars Gradivo era Agricultor e depois se tornou guerreiro.


Marte, Marspiter (Pater Mars) ou Mavors, palavra que se assemelha mors (morte) eram nomes para o Deus da Guerra dos romanos. Seus cultos eram dirigidos por um Flamen* (flâmine) e seus sacerdotes chamados de Sálios que executavam em sua honra danças guerreira nos vários templos do Deus na cidade. O primeiro mês do ano Março era dedicado a ele e O local para treinamentos militares dos jovens romanos era chamado de Campo de Marte.


Foi identificado com o Ares grego, apesar da pouca semelhança que havia entre os dois.


AVE PATER GRADIVUS, que sua energia faça a força crescer em nós !


* Flâmines – classe particular de sacerdotes instituída por Numa Pompilio. Eram chamados assim pelo fio de Lã laranja que amarrava seus cabelos.

A principio eram 3 destinadas as maiores divindades de Roma: Jupíter, Marte e Quirino (Jano), depois seu numero foi aumentado para 15, os três primeiros Chamados de Flâmines maiores eram tirados do Senado, os demais os Flâmines menores eram escolhidos nas famílias plebéias.

Dialis Flamem era o maior deles e era o sacerdote de Júpiter.


terça-feira, novembro 06, 2007

Hecáte e Dionisio

O que parece improvável, pois geralmente consideramos Dionisio o deus do vinho e da alegria e Hécate uma deusa dos mundos inferiores, é perfeitamente cabível quando nos aprofundamos no mito de Zagreus o primeiro Dionisio.

Zagreus foi desmembrado e comido pelos Titãs, porém Athena com o rosto coberto por caulim se juntou aos titãs e subtraiu dos Titãs o coração de Dionisio, que continuou pulsando em suas mãos, e o levou a Zeus.

Zeus construiu uma imagem de Dioniso com seus restos calcinados pelo fogo, misturados aos restos dos titãs esturricados por seus raios e nesta imagem guardou o coração pulsante de Dionisio Zagreus, até que chegasse o momento de seu segundo nascimento.

Zagreus era um Deus e portanto imortal, porém, sem seu corpo deveria descer ao Hades, mas o seu coração pulsante dizia que ele ainda estava vivo, e não conseguiu atravessar a terra dos mortos para chegar ao tártaro onde são guardados os espíritos imortais.

Neste período vestiu seu espirito com uma pele de cabra preta e seguiu o cortejo de Hécate como Zagreus Melánagis (o da pele de cabra preta) sendo conhecido como Dionisio Niktélios o que caminha a noite.

O culto de Dionisio Melánagis foi iniciado pelas filhas de Eleutero para quem Dionisio aparece como um fantasma vestido com a pele negra, quando elas não o aceitaram e o injuriaram. O deus as enlouquece, para voltar a sanidade as moças são obrigadas a adorar Melánagis, o Dionisio escuro associado aos mortos.

Um outro culto que nos leva esta associação ente Dionisio e Hécate é o seu culto em Olímpia onde Dionisio era invocado com o titulo de Herói como corresponde a habitantes do mundo subterrâneo. Era invocado pelos gritos " Axie Taúre!" ( digno touro) e pelo cantico:

Vem Dionisio Herói

Ao templo á beira mar

Vem com as graças do puro templo

Vem Raivando, com pés de Touro

Ainda não podemos esquecer da ligação de Dionisio com Ariadne a Senhora do Labirinto, que muitas vezes é vista como mãe e esposa do Dionisio Cretence, uma deusa dos mundos subterranios que morreu e foi enterrada com um filho vivo no ventre, que nasce e trás de volta sua mãe a vida. Nesta visão de Ariadne como Perséfone fica mais clara ainda da ligação de Dionisio, ou pelo menos Zagreus, com Hécate.

quinta-feira, novembro 01, 2007

Ave Júpiter



Virgílio mostra Enéas e os seus companheiros presas de uma horrível tempestade e na iminência de perecerem. A deusa. Vênus, aterrorizada, implora a seu pai, o rei dos deuses. "Que crime cometeu o meu Enéias contra ti, e que fizeram os Troianos para que, após tanta luta, procurando chegar ã Itália, vejam toda a terra fechar-se diante deles? Entretanto, era deles que devia nascer Roma. Tu o prometeste; que te fez mudar, pai?" Então Júpiter acalma-a nestes termos

"Nada temas; o destino dos teus permanece imutável: como prometi, poderás ver a cidade e as muralhas de Lavinium e transportarás o magnânimo Enéas até o céu estrelado; não, eu não mudei de opinião. Sob os teus olhos, Enéas na Itália dirigirá rude guerra, aniquilará tribos ferozes; dará aos seus guerreiros muralhas e leis. Depois dele, seu filho Ascânio (que se chama também Iulo) deixará Lavínium para estabelecer o seu trono no rochedo de Alba que ele cercará de sólidas muralhas. A sacerdotisa, de família real, cara a Marte, terá dois filhos gêmeos. Depois Romulo, por seu turno, perpetuará a raça, erguerá os muros de Marte e dará o seu nome ao povo dos Romanos. Não limito o seu poder nem no tempo nem no espaço: dei-lhes um império sem fim"

Pelo que sinto, Júpiter cumpriu suas promessas, se não o povo romano, mas a igreja que leva o seu nome ainda mantém um Império, que esqueceu-se dos antigos deuses. Em nossas leis e costumes ainda encontramos a civilização romana. Devemos despertar novamente os deuses, para que eles façam que o mundo retome seu curso e o equilíbrio volte ao nosso planeta

quarta-feira, outubro 31, 2007

Halloween, ARGH! BLEGS!

Legal, é gostoso, é brincadeira, mas não vale a pena ler as merdas que postam na rede este dia e as coisas que aparecem na midia.

Parece que temos o Dia das Bruxas um novo Primeiro de Abril qualquer bobagem vale, qualquer mentira pode ser contada. Mas o pior de tudo são os que se levam a sério e tentam justificar históricamente a dada, mesmo na Wikipedia encontramos joias como esta:

"A origem do halloween remonta às tradições dos povos que habitaram a Gália e as ilhas da Grã-Bretanha entre os anos 600 a.C. e 800 d.C., embora com marcadas diferenças em relação às atuais abóboras ou da famosa frase "Gostosuras ou travessuras", exportada pelos Estados Unidos, que popularizaram a comemoração."

Se lembrarmos que nesta época a Galia foi tomada por bárbaros germânicos como Godos, Visigodos e Francos e a Inglaterra por Saxões e a Irlanda havia sido convertida ao cristianismo por S. Patrício no ano 400 eu gostaria de saber que celtas habitavam estes lugares entre os anos 600 e 800?

Fora a tentativa de explicar a origem do nome, que misturam raízes saxãs e dizem que é gaélico.

Também tem os textinhos que recebemos por e-mail, falando das maravilhas desta noite.

Gente... vamos brincar de bruxos almas do outro mundo... vamos comprar mascaras e usar fantasias, mas por favor, vamos manter a sanidade!!!!!!

terça-feira, outubro 30, 2007

Oxóssi


Se existia um Orixá do candomblé que eu não ia com a cara, este Orixá era Oxóssi . Não sei exatamente a razão, se era alguma quizila com Oxoguiã, lembranças minhas de um irmão de santo que era um porre, ou se acabei cometendo um erro comum, afinal todos erramos já que Ate foi expulsa do Olimpo e fez morada ente os homens. Assim há 35 anos acabei confundindo a divindade com seu filho. Portanto a minha visão de Oxóssi ficou sendo a do "Dofono de Oxóssi " lá de casa. Falso, dissimulado, fofoqueiro e com uma enorme tendência a querer aparecer era a imagem que fazia do Orixá.

Vivo sempre dizendo que o tempo é o melhor remédio, que o tempo é sábio, não vejo Saturno como um deus maléfico e rabugento, mas como a sabedoria que só o tempo nos dá. E neste caso precisei de 35 anos para compreender meu erro e esta compressão começou quando conheci o Júlio César, um filho de Oxóssi , amigo da tribo. O Júlio é um apolinho negro, bonito, malhadinho, com a cabeça aberta para o conhecimento e principalmente um reformador do candomblé. Acho linda a sua crença que é possível modernizar o candomblé sem ferir os preceitos e os fundamentos e sua vontade de trocar conhecimento.

Mas este texto não é uma elegia e portanto, vamos voltar ao assunto principal, que é o reconhecimento do meu erro em relação a uma divindade.

No ultimo fim de semana, todos meus preconceitos em relação a Oxóssi , caíram por terra quando o Oxóssi do Julio me abraçou: Senti a energia vibrante da divindade e esta dissipou todos os preconceitos que eu tinha em relação ao Orixá. Assim como os Deuses que cultuo hoje, embora nunca tenha esquecido ou abandonado o Oxaguiã, os Orixás são deuses, vibram como tais e reúnem em si as dualidades e polaridades.

É claro que Oxóssi é tudo que eu pensava, matreiro e dissimulado como deve ser um deus que caça. Se move furtivamente, se esconde por trás das folhas para não espantar a caça tal e qual ao Zagreus o grande caçador. Porém ele não é só isto é muito mais.

Eu que tanto reclamo das pessoas em geral que vêem os deuses apenas nos seus arquétipos básicos e ignoram os demais aspectos, estava fazendo exatamente isto com este deus africano.

Agradeço aqui publicamente a Oxóssi, por me ensinar uma lição que sempre passo, mas que não havia apreendido totalmente.

Obrigado Oxóssi , pelo carinho e pelo abraço que me mostrou o meu erro.

Oke Arô "Okê"

segunda-feira, outubro 22, 2007

O Tempero da Vida


Bem Vindo tu que sofreste sofreres que nunca sofrera

De homem um Deus, te fizeste...

(Inscrição tumular na cidade de Turioi Século IV ac.)

Depois que Baco, que clama Evoé, for ferido

Sangue, fogo e pó vão ser misturados.

(Fragmento de autoria desconhecida

sobre o sacrifício do bode como representação dionisíaca)

O galo cantou a primeira vez e a madrugada continuou a avançar...

O galo cantou a Segunda vez e o noturno Zagreus Nyktélios relembra a dor do seu corpo desmembrado e caminha dentro da noite com passos que mantém o ritmo de seu coração pulsante guardado por Zeus.

O deus morto se mantém vivo, embora não tenha mais corpo, pois este serviu de banquete aos titãs. Vive no Ctônico em que foi criado mas volta a terra sem formas coberto pela pele de uma cabra preta.

Zagreus Melánaigis, o negro Dionisio, aquele que conhece e compreende a dor dos homens, anda na noite negra. Escuta as suplicas de um de seus filhos que o invoca e sabe que onde ele é chamado existe a dor e o sofrimento, por isto agora voa nas asas de Nix para atender seu chamado. Melánaigis conhece as dores da morte, lutou contra ela mas foi imolado, cortado em quartos e fervido em leite e devorado. Um deus não morre e Zagreus sentiu os titânicos dentes na sua carne, dores que os deuses não sentem. Não desceu aos mundos subterrâneos, pois uma sombra branda coberta de caulim recolheu seu coração e o manteve pulsante e por não morrer não pode entrar no Hades. Por isto busca seu filho que sofre e agoniza.

Um pio agudo rasga a noite e agora ele sabe para onde ir. É Hécate indicando o caminho.

Seu filho está envolto em dores e o frio da morte lhe provoca arrepios e contrações musculares, a Trivia já abriu seus portais e grita como ave agourenta para que o iniciado a siga para os mundos inferiores. Zagreus chega a tempo e toma seu filho para si, e divide com ele o corpo e faz com ajuda de Hecate que o processo de morte e renascimento ocorra sem que a alma fosse levada ao Hades, e renasce com seu filho em seu corpo.

Agora ambos são um, Pai e filho estão juntos no corpo integro do iniciado. Do fundo de sua garganta morta um felino rosna como um gato acuado, os pés se firmam sobre a negra lama de Cybele e se misturam no pântano ctônico da criação até quase os tornozelos e a força da Deusa Mãe percorre o corpo do homem deus, que se firma sobre seus pé e Ri.

O Riso se transforma em gargalhadas de pura alegria de viver, o sangue aquece os músculos, a vida retorna e Zagreus renasce para o mundo, seu sua alegria retorna a terra, para temperar um mundo de dissabores, tristezas e dores que fazem parte da vida. Renasce conhecendo a morte, sabendo o que os deuses não sabem, abraçando a vida humana como um todo, reconhecendo a importância da vida física e mortal e o prazer de estar vivo e sabe que seu trabalho é aliviar as dores, igualar as desigualdades e oferecer aos homens uma segunda chance e o poder de mudar suas próprias vidas seja permanentemente ou nos momentos de embriagues.

O galo canta pela terceira vez e Eos desperta e rasga a noite com dedos lilases deixando que Helios se mostre no horizonte, mas Hera desconfiada enche o mundo de brumas, para esconder a luz. Porém é Dionisio quem nasce e o que devia esconder sua glória, apenas refresca o ar e o que podia ser uma praga se transforma em benção um dia de brumas claras para embalar o sono do recém nascido.

Dionisio Zagreus é um deus das mulheres, que são aquelas que geram homens, a elas ele da o conforto das caricias que temperam o amor humano, e é por ele que elas rasgam suas roupas soltam as cabeleiras e correm para os montes para louva-lo.

É nele que todos se refugiam quando a vida perde o sabor e se transforma num fardo pesado a carregar, é Dionisio quem trás a alegria aos humanos através do vinho e de sua sábia loucura é ele que nos ajuda a viver.

Dioniso é o que tempera a vida, é aquele que dá o sabor de viver, pois ele, somente ele que conhece a noite escura e a morte.

Ser da tribo

Não importa muito como a chamamos, se tribo, gens, familia ou clã, o significado é um só: Comungar as mesmas crenças e respeitar aos outros como irmãos. Nada desta coisa hipócrita de ordens mágicas onde chamamos os companheiros de irmãos e os traímos na primeira oportunidade.

Ser da tribo é ser acolhido, é aceitar uma nova família, a família que você fez a opção de participar e onde os laços de sangue são substituídos por laços ainda mais fortes que o próprio sangue, os laços espirituais de uma existência, amigos e irmãos há muito perdidos na roda das encarnações, que se reencontram e se reconhecem.

Ser da tribo é deixar o eu pelo nós. É esquecer as futilidades do convívio social e se entregar sem medo e sem interesses à esta nova família.

Ser da tribo é compartilhar conhecimentos e segredos da sua alma. É receber apoio sem precisar pedir e ver nos olhos de quem te apoia não um brilho complacente ou superior de quem te ajuda, mas sim a verdadeira felicidade do prazer de compartilhar um momento junto e fazer desde momento algo mágico, que nos parece irreal no mundo que vivemos.

Ser da Tribo é deixar sua individualidade, é parar de querer ganhar vantagens sozinho e compartilhar as vitórias. É deixar de atropelar pessoas que gostam de você por uma vantagem pessoal. É respeitar aqueles que o cercam.

Bem ... porque estou falando isto?

Porque nesta semana que passei sumido, pude ver tudo isto acontecendo no seio da família que decidi fazer parte. Vi o esforço coletivo destas pessoas que viajaram, ficaram noites sem dormir, dispuseram recursos financeiros para que um objetivo comum se concretizasse, e vi nos olhos de todos eles a felicidade de partilhar um pouco de suas vidas comigo.

Ontem acordei como um membro da Tribo, e pude perceber que isto é muito importante, não aquela importância banal que tem as coisas feitas por algum objetivo escuso, mas sim a importância de participar da vida de pessoas que amamos, que queremos ficar juntos, simplesmente por que temos prazer de estar com elas.

Hoje sinto que sou parte da Tribo, qual tribo? Não importa, o nome ou os objetivos. O que importa é que é a minha tribo.

segunda-feira, outubro 15, 2007

Outro dia surgiu uma discussão numa comunidade sobre a morte dos deuses, ao que respondi que os deuses morriam, quando nós humanos nos esquecíamos deles. Aí sempre aparecem aqueles que dizem que os deuses nunca morrem, e que nós não temos a menor influencia nisso.
As energias divinas nunca morrem, porém estas energias ou os nomes e formas que damos a elas morrem sim, mudam de nome e se mantém como energia divina, mas a visão que nossos ancestrais tinham delas desaparecem.
Antes mesmo que Romulo ocupasse o monte Palatino, sobre a Colina Vélia, já existia um templo em honra a Mutunus Tutunus, as antigas lendas contam que este templo existia desde os primórdios, e nele era cultuado este Deus na forma de um falo viril. Mutunus Tutunos era o Deus de toda fecundação, estava ligado a procriação humana, dos animais e a fertilidade da terra mãe.
Sabemos muito pouco deste antigo deus latino, e por maior ironia dos quatro autores que citam seu nome, o que nos dá mais pistas sobre seu culto é justamente Santo Agostinho (que menciona seu nome em Cidade de Deus - Livro IV capitulo XI e descreve o seu culto no - Livro VII capitulo XXI já com o nome de Libero)
"Eis uma das coisas que me vejo forçado a silenciar, por serem muitas: Nas encruzilhadas da Itália celebravam-se os mistérios de Libero, diz Varrão, com tamanha libertinagem e torpeza, que em sua honra se reverenciavam as partes viris do homem. Não o faziam em segredo, caso em que seria mais vergonhoso, mas em público, triunfando, assim, a carnal torpeza. Durante as festividades de Libero, o vergonhoso membro era, com grande honra, posto em cima de carros e passeado, primeiro do campo às encruzilhadas, depois pelas cercanias de Roma, onde acabava entrando.
Na cidade chamada Lavínio dedicava-se um mês inteiro às festividades de Libero. Durante trinta dias todos usavam as palavras mais indecorosas, até que o referido membro, depois de conduzido em procissão pelas ruas, fosse repousar, enfim, em seu lugar. Ao desonesto membro era preciso que honestíssima mãe de família lhe impusesse publicamente a coroa. Desse modo se devia tornar propício o deus Libero, para maior rendimento das colheitas. Assim devia repelir-se dos campos o feitiço, a fim de a matrona ver-se obrigada a fazer em público o que até a meretriz se deveria proibir fazer em cena, se espectadoras as matronas."
Mutunus Tatunus o Dionisio dos Etruscos e Latinos Primordiais, não cumpria apenas este culto agrícola, mas a toda a criação, para os humanos que levavam sua estátua (em tamanho menor) para a porta de suas casas como símbolo apotropaico, para afastar feitiços e malefícios lançados por inimigos, mas também para o interior da alcova como amuleto fecundador ou ao leito nupcial onde a estatueta era usada para que a noiva sentasse sobre ela consagrando ao deus sua virgindade, protegendo o noivo do perigo magico que a defloração de uma mulher causaria a ele, já que entre os antigos etruscos a sacralidade da mulher como força da natureza, não podia ser tocada pelo homem.
Este fato Ligado a Mutunus Tutunus, me fez compreender o papel de Hermes na Grécia, junto ao leito nupcial como deflorador das noivas. Algo que até encontrar com este deus esquecido, não consegui compreender. É provável que estes costumes venham dos primeiros povos agrícolas do neolítico, onde o feminino pode ter tido um destaque maior que o masculino, já que nestas sociedades o culto a Mãe Terra era dominante.
Embora Mutunus Tutunus, tenha sido esquecido, seu culto permaneceu em Líbero, depois Pater Liber que finalmente se funde ao culto dionisíaco vindo da Grécia.
O culto a Pater Liber simbolizava a fecundidade da natureza e espalhou-se por toda a Itália, fazendo com que o senado romano temesse que ele fosse capaz de desestabilizar a republica e por isto foi proibido no ano de 186 A.C. mas como nunca deixou de ser cultuado nos campos, a febre dionisíaca continuou rondando Roma até que nos primórdios do Império, volta com toda a força, não mais nos humildes camponeses mas sim na aristocracia romana que acolheu suas imagens e seus mitos. Na Roma Imperial, que são as ruínas que encontramos hoje, sua imagem como o falo é onipresente em estátuas, amuletos e afrescos como os que encontramos na vila dos mistérios em Pompéia.
Mostrando que os deuses antigos são esquecidos e mortos, mas retornam em novos deuses, que mantém vivas as forças da natureza que geraram os deuses primordiais.

MVTVNVS TUTUNUS II

Engraçado, quando resolvi escrever sobre Mutunus Tutunus, pensei em apenas mostrar a evolução de um deus em relação ao desenvolvimento da sociedade que o cultuava, não imaginei que chamaria a discussão de outros pontos.

Os Romanos, com seu Império de mais de mil anos, que tanto influenciaram a sociedade ocidental, viam sua civilização como o estado da ordem contra a barbárie. E buscaram civilizar seus deuses e que estes fossem os agentes da ordem, os pilares de uma sociedade organizada se opondo ao caos.
Por isto Mutunus Tutunos a força incontrolável da fertilidade foi suavizada e transformada com sua fusão a outros deuses. Por isto também o culto dionisíaco foi considerado subversivo e finalmente proibido. Porém existem forças da natureza que são impossíveis de serem controladas, a fertilidade humana, animal e vegetal é uma delas. Brota do interior da terra e explode a cada primavera nos campos e também nos humanos e por isto: Por mais que as amarras das religiões e da ordem social tentem imobiliza-la, ela sempre volta e cada vez com mais força. O fascínio do membro viril ereto vem dos primórdios da nossa raça, desde o paleolítico estão gravadas nas paredes de pedra das cavernas este símbolo da força da reprodução.


Os romanos ficavam numa encruzilhada sem alternativas, ao mesmo tempo que precisavam incentivar a fertilidade, pois precisavam de filhos de Roma para o crescimento das gens e de seu império, viam no sexo um fator de instabilidade para o império, pois era uma força irrefreável da natureza portanto difícil de ser controlada. E assim Roma ficou encurralada entre dois grandes perigos: Se negligenciassem os cultos a fertilidade e virilidade as fontes da vida em seus territórios poderiam secar; outro que não temia menos, liberar estas praticas e estas viessem a provocar acessos de fanatismo e desordem tão prejudiciais a Urbe. O medo do senado em relação aos cultos dionisíacos, na época dos escandalosos bacanais da epidemia de Dionisio, não era menor que o que tinham em relação ao culto de Vênus a patrona dos amores.

E ainda que o Estado romano proibisse ou mascarasse o culto a estas divindades o Falo e a Figa eram símbolos da vida e eram fartamente usados para afastar o mal e as doenças, proteção das casas e para a fertilidade dos campos. A vida pulsante e forte e o sexo, eram sem duvida o melhor amuleto para afastar as sombras.




quarta-feira, outubro 10, 2007

Vênus


"Amanhã é o dia em que pela primeira vez Éter celebrou suas bodas. Para criar suas nuvens primaveris o ano todo esse pai se espalhou, em chuva amorosa, no seio de sua fecunda esposa; unido a esse grande corpo, ele produzira todos os seres. E Vênus que, com seu alento sutil, penetra o sangue e a alma para exercer sobre a procriação seu poder misterioso. Através dos céus, através das terras, através do mar, ela abriu para si um caminho que não cessa de impregnar com os germes da vida, e, á sua ordem, o mundo aprendeu a gerar."

(Autor desconhecido, recolhido pelo historiador do Século I Lucio Anneo Floro)

terça-feira, outubro 09, 2007

Música de cama,



Sobre mim cavalgas
cingindo-me os flancos
Colhes à passagem
a luz do instante
De dentes cerrados
ondulas avanças
retesas os braços
comprimes as ancas
Depois para a frente
inclinas-te olhando
o que entre dois ventres
ocorre entretanto
e o próprio galope
em que vais lançada
Que lua te empolga
Que sol te embriaga
Lua e sol tu és
enquanto cavalgas
amazona e égua
de espora cravada
no centro do corpo
Centauresa alada
com os seios soltos
como feitos de água
Queria bebê-los
quando mais te dobras
Os cabelos esses
sorvê-los agora
Mas de cada vez
que o rosto aproximas
já é outra a sede
que me queima a língua
A de nos teus olhos
tão perto dos meus
descobrir o modo
de beber o céu

(David Mourão-Ferreira, 1927-1996, Portugal in
"Eros de Passagem - Poesia Erótica Contemporânea"
Campo das Letras, Porto, 1997)