quarta-feira, julho 20, 2005

Palavras Caladas



É estranho como as vezes como que do nada, através de uma musica, um cheiro, foto ou algum pequeno fragmento de memória nos acerta antes mesmo que a gente perceba, um vórtice nos atinge e em átimos de segundos somos arrebatados por uma fenda do tempo e revivemos uma situação ocorrida a milênios, quando a terra ainda era nova e eu anda acreditava em morrer de amor, coisa que pra quem leu o post abaixo sabe que não acredito mais. Porém quando estes loucos déjà vus criam um verdadeiro rendez-vous com nosso próprio passado.
Assim quando querendo assistir Ray, os primeiros acordes de piano, de Georgia On My Mind, me levaram para o primeiro ano da Década 70’ em Peruibe, litoral sul de São Paulo, num bar chamado Play Bar onde um conjunto chamado os Condors tocaram a musica, que me fez atravessar a pista e tirar uma moça pra dançar.
Uma deusa, cabelos castanhos escuros numa longa trança, grandona, um rosto misterioso, que conhecia aqui de Sampa, mas que até aquele momento não acreditava ter nenhuma chance. Mas acaso ou vontade dos deuses, ou o apelo da musica, mal começamos a dançar, nos agarramos e os lábios se tocaram, para que os beijos engolissem todas as palavras que poderiam ser ditas, e da pista de dança para um canto do bar, do bar pra praia e nossas bocas que nada falavam se consumiam ávidas, como se de cada beijo dependesse a vida. Respirávamos o ar um do outro e nossa saliva era a mais alucinante das bebidas que como um rápido vício criava dependência fazendo que fosse impossível falar sobre o que sentíamos.
Selamos com beijos a paixão, tudo que poderia ser dito foi falado através de toques, leves mordidas e lambidas. Uma noite inteira de beijos apaixonados repleta de desejos incontidos e promessas explicitadas em sussurros inaudíveis o que permitia que todos os sonhos fossem verdadeiros, e que todas as promessas que não foram feitas tivessem chance de serem cumpridas.
Mas naquela época eu acreditava que podia morrer de amor, e na semana seguinte quando voltei a praia para reencontra-la, já conheci outra no caminho, mas ainda assim passamos mais uma noite de beijos( poucas garotas faziam sexo em 1971) e na terceira viagem, ela foi que já estava conhecendo outro, e pra não ficar sozinho, também fiquei com outra.
Quem sabe se o medo de morrer de amor, afastou a gente, o medo de amar o medo de se entregar, de fechar os olhos e largar o corpo para trás sabendo que alguém que você confia estará ali, sempre pronta para te segurar antes que a cabeça se espatife no chão.
É claro que as vezes os deuses nos dão uma chance, e fazem com que algumas situações se repitam. É claro que a musica, o local e a pessoa não são mais a mesma, mas é nos dado uma nova oportunidade e agora passando tanto tempo, arriscar mais, e não fugir e quem sabe, o que não ocorreu com Georgia On My Mind, possa ocorrer com What Am I toYou? Cantado pela Norah Jones ? Afinal uma noite de beijos e de promessas caladas valem tanto, nestes tempos de palavras vazias, e os sentimentos e os sentidos valem muito mais que as palavras e os signos que esta carregam.


O Medo de Amar é o Medo de Ser Livre
Composição: B. Guedes/F. Brant


O medo de amar é o medo de ser
Livre para o que der e vier
Livre para sempre estar onde o justo estiver
O medo de amar é o medo de ter
De a todo momento escolher
Com acerto e precisão a melhor direção
O sol levantou mais cedo e quis
Em nossa casa fechada entrar
Prá ficar
O medo de amar é não arriscar
Esperando que façam por nós
O que é nosso dever: recusar o poder
O sol levantou mais cedo e cegou
O medo nos olhos de quem foi ver
Tanta luz

Um comentário:

Anônimo disse...

belo texto!
Baixei a música!
enviei pra todo mundo que tava precisando ler isso!
beijos!